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Recursos Previdenciários

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Um tema que tem trazido muita inquietação aos dirigentes e gestores dos entes federativos e dos Regimes Próprios de Previdência Social – RPPS, diz respeito à correta utilização dos recursos previdenciários para o custeamento das despesas administrativas do regime, as denominadas despesas administrativas, ou seja, aquelas necessárias à organização e funcionamento do regime, ou como dizem, as necessárias à operacionalização.

Numa empresa com finalidade comercial, são considerados operacionais todos os gastos necessários às atividades normais, de rotina, entendendo-se como necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pelas suas atividades, excluindo-se deste conceito os gastos vinculados ao custo do serviço ou produto, estas classificadas como não-operacionais.

Na atividade pública regida pela Lei nº 4.320/1964[1], as despesas são classificadas, em linhas gerais, em duas categorias econômicas: despesas correntes e despesas de capital, sendo as primeiras, vinculadas ao custeio das atividades de rotina da entidade, inclusive a manutenção e conservação dos bens de uso, e as segundas, representadas pelos gastos para aquisição de novos ativos.

Os RPPSs, independentemente de possuir ou não personalidade jurídica, são entidades públicas, encontrando-se, portanto, sob a égide da Lei 4.320/1964, que estatui as normas gerais de direito financeiro, devendo seguir todos os seus rituais quanto à execução orçamentária e seus controles.

Em relação às despesas administrativas do RPPS, a questão fundamental cinge-se tão somente quanto uma possível fonte de financiamento dessas despesas, tendo em vista o que dispõe a Lei nº 9.717/1998[2], que, como exceção, autoriza a utilização de parte dos recursos originalmente previdenciários para o pagamento das despesas correntes e de capital necessárias à organização e funcionamento da unidade gestora do regime próprio, no limite estabelecido pelo órgão regulador e fiscalizador, no caso o Ministério da Previdência Social – MPS, atualmente delimitado em valor corresponde a 2% calculados sobre a folha de pagamentos dos segurados e beneficiários vinculados ao RPPS, relativamente ao exercício imediatamente anterior, equivalendo a dizer, portanto, que o limite se restringe ao custeamento das despesas administrativas com os recursos previdenciários, não colocando qualquer óbice quanto a pagamentos de despesas administrativas do RPPS em valores superiores ao limite estabelecido, desde que com recursos de fonte não previdenciária do tesouro do ente federativo.

É imprescindível que a legislação editada pelo ente federativo sobre a organização e funcionamento do seu RPPS estabeleça, com clareza, o limite de gastos com as despesas administrativas ou crie a taxa de administração com custeamento mediante a utilização dos recursos previdenciários, observando o percentual e base de cálculo já mencionado.

Importante observar ainda que, se o ente fixar em lei a taxa de administração tendo como fonte os recursos previdenciários, pode o RPPS, ao final de cada exercício, constituir reserva com eventuais sobras de recursos para a utilização em outros exercícios, desde que para o pagamento, exclusivamente, de despesas correntes e de capital, por exemplo, em projetos de melhoramento das estruturas físicas da unidade gestora[3], salientando não ser possível criar reserva relativamente a exercícios anteriores.

Pode o ente federativo definir taxa de administração para o RPPS desvinculada dos recursos previdenciários? A resposta é positiva, ou seja, pode ser definida de forma que o ente repasse o seu valor à unidade gestora do RPPS sem que onere os valores decorrentes das alíquotas de contribuição. Nesta situação, a legislação deve definir o percentual e repassar à unidade gestora do RPPS, onerando uma determinada fonte do seu orçamento e o RPPS.

Como fazer? Digamos que a partir da avaliação atuarial é exigida, por exemplo, a alíquota patronal de 22% com finalidade exclusiva para o pagamento de benefícios previdenciários, segundo a lei do ente federativo, o valor decorrente dessa alíquota deve ser repassado diretamente para as contas bancárias que representam os fundos de previdência e somente podem utilizados para o pagamento de benefícios e assim classificados contabilmente. Por outro lado, os valores definidos para a taxa de administração, mediante percentual de 2% incidentes sobre a totalidade da folha de pagamentos dos servidores, aposentados e pensionistas relativamente ao exercício anterior, ou em valores determinados em cada orçamento, devem ser repassados para conta bancária específica, sendo os seus valores classificados em contas específicas definidas no Plano de Contas Aplicado aos RPPSs, salientando que em qualquer situação, não há impeditivo legal ou normativo de que eventuais reservas sejam direcionadas para finalidade previdenciária por decisão administrativa. Assim procedendo, não há possibilidade de retorno dos recursos para fins de pagamento de despesas administrativas, pois os recursos se tornaram previdenciários.

Há pelo menos duas implicações imediatas: i) a taxa de administração não onera o custo previdenciário, portanto, repercutindo positivamente no resultado da avaliação atuarial reduzindo o déficit ou exigindo menor alíquota de contribuição previdenciária; e ii) com exceção das despesas decorrentes da folha de pagamentos do RPPS, as demais despesas, por exemplo, pagamento de luz, telefone, manutenção, etc., não deixam de repercutir no limite de despesa com pessoal do ente federativo exigido pela lei de responsabilidade fiscal.

Alguns questionamentos comumente levantados:

 

  1. Podem ser utilizados os recursos da taxa de administração para pagamento de reformas ou melhorias em imóveis do RPPS?

Para os imóveis de uso da unidade gestora não há restrições, já para os imóveis com finalidade previdenciária, ou seja, imóveis classificados como de investimentos, há que observar a orientação contida em norma do MPS[4] que admite tal gasto desde que seja garantido o retorno dos valores empregados, mediante processo de análise de viabilidade econômico-financeira.

  1. b) Pode o RPPS pagar consultorias com os recursos da taxa de administração?

Sim. Eventuais contratações de consultorias para prestação de serviços de interesse do RPPS somente pode ser custeada com os recursos da taxa de administração[5].

  1. c) Pode o RPPS pagar despesas com cursos e participação dos gestores e servidores do RPPS? A legislação não traz qualquer óbice, pois tais gastos, assim como os demais casos acima, estão contemplados no conceito de despesas correntes e por certo tendem a promover a melhoria da gestão dos regimes.
  2. d) Pode o RPPS pagar despesas decorrentes de aplicações de recursos no mercado financeiro com recursos da taxa de administração?

Não. Eventuais despesas devem ser suportadas com os próprios rendimentos das aplicações[6], razão pela qual os gestores devem ter muita prudência no momento da decisão em aplicar em determinados fundos ou segmentos, pois mesmo que seja prometido um rendimento atrativo, a taxa de administração do fundo de investimento pode levar a suposta vantagem, considerando ainda, primordialmente os riscos do negócio.

[1] Capítulo III – Da Despesa, art. 12 a 21.

[2] Art. 1º, III.

[3] Art. 15, III, da Portaria MPS nº 402/2008.

[4] Art. 15, § 3º da Portaria MPS nº 402/2008.

[5] Art. 15, § 2º da Portaria MPS nº 402/2008.

[6] Art. 15, II,  da Portaria MPS nº 402/2008.

 

  • Otoni Gonçalves GuimarãesAuditor Fiscal da Receita Federal do Brasil

    em exercício no Ministério da Previdencia Social

    otonig@globo.com