A aposentadoria diferenciada para pessoas com deficiência foi conquistada pela Emenda Constitucional nº 47/05, a qual pretendeu suprimir lacuna protetiva deixada pela Assembléia Nacional Constituinte. As reformas seguintes, até 2005, trouxeram ressalvas particulares, especialmente para pessoas envolvidas em atividades insalubres, mas nada sobre a pessoa com deficiência.
A EC nº 47/05, ao alterar o art. 40, § 1º da Constituição, trouxe a possibilidade da pessoa com deficiência, nos termos de lei complementar, usufruir de tratamento diferenciado para fins de aposentadoria. Assim como no Regime Geral de Previdência Social – RGPS, admite-se, pela primeira vez no Brasil, que a deficiência permita, no âmbito previdenciário, a possibilidade do retiro precoce, como forma de compensação social.
A regulamentação do tema não é simples, pois, a depender do conceito de deficiência utilizado, contingentes elevados podem ser alcançados. Dentro de alguns parâmetros admitidos, especialmente após a Convenção Internacional da Pessoa com Deficiência, ratificada pelo Brasil pelo Decreto nº 6.949/09, e de acordo com dados do IBGE, mais de 23% da população brasileira teria alguma deficiência. Partindo da premissa que todas essas pessoas possam obter aposentadoria diferenciada, o impacto nos regimes previdenciários é enorme, a ponto de demandar completa revisão do plano de custeio, sob pena de inviabilidade atuarial.
No âmbito do RGPS, o tema foi regulamentado pela Lei Complementar nº 142, de 08 de maio de 2013. A normativa prevê benefícios reduzidos na proporção da deficiência, que é subdividida nos graus leve, moderado ou grave (art. 3º). Em resumo, permite os benefícios após 25 anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; 29 anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada e 33 anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve. Para aposentadoria por idade, aos 60 anos de idade, se homem, e 55 anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.
A lei, expressamente, limita sua aplicabilidade ao RGPS, nada tratando dos regimes próprios de previdência social. A lacuna normativa, todavia, não permanecerá. Já há alguns anos, com forte apoio no Supremo Tribunal Federal, consolida-se a doutrina da efetividade da Constituição, a qual, como norma jurídica dotada de validade e eficácia, demanda ações concretas do Executivo, o qual não poderia beneficiar-se de omissões do Legislativo como argumento a pretensões legítimas da sociedade. Como consequência, os mandados de injunção – instrumento criado pela Constituição justamente para suprir, judicialmente, ausência de regulamentação legal – têm ganhado corpo e ampla aplicação nas demandas previdenciárias.
No aspecto particular do servidor público com deficiência, o STF já possui precedente favorável à aplicação da LC nº 142/13, como se observa no MI 5.126-DF, de relatoria do Min. Luiz Fux. A questão é, em verdade, de simples solução, pois a própria Constituição afirma que, na hipótese de lacuna normativa do RPPS, aplica-se o regramento do Regime Geral (art. 40, § 12 da Constituição). Não há dúvidas que muitos outros precedentes virão.
Diante dessa realidade, não há outra opção diversa da adequação dos RPPSs. É importante, desde já, que os gestores busquem identificar, no universo dos participantes, o percentual de pessoas dotadas de necessidades especiais e impacto no custeio do sistema. A mudança, ainda que claramente onerosa para os regimes previdenciários, é irreversível e atende a preceito expresso da Constituição.
- Fábio Zambitte é Doutor em Direito Público – UERJ; Mestre em Direito Previdenciário – PUC/SP; Prof. da FGV/RJ; Prof. e coordenador de Direito Previdenciário da EMERJ; Conselheiro Rep. do Governo no Cons. de Recursos da Previdência Social – MPS; Auditor Fiscal da Receita Federal; Prof. de Direito Previdenciário do Centro de Estudos Jurídicos 11 de Agosto – CEJ Fórum/RJ